terça-feira, 21 de junho de 2011

Cenários e objetos de arte roubam a cena na TV brasileira

d. Foto: Afonso Carlos/Carta Z Notícias /DivulgaçãoTrabalho de cenógrafos e produtores de arte tem se destacado cada vez mais
Foto: Afonso Carlos/Carta Z Notícias /Divulgação 

Mariana Trigo
Em muitas produções, o que salta aos olhos nem sempre é a interpretação dos protagonistas, a qualidade do texto ou a direção do folhetim. Muitas vezes, assim que começa um capítulo, os olhares do público podem ser desviados para cenários exuberantes, objetos de cena hipnóticos ou lugares paradisíacos simplesmente encantadores. Com os recursos da TV de alta definição, cada vez mais o trabalho dos cenógrafos e produtores de arte tem se destacado em novelas e minisséries, pelo minucioso acabamento e pela criatividade de transformar simples cenários em verdadeiras apoteoses visuais.
Em Cordel Encantado, por exemplo, o trabalho de cenografia e produção de arte pode ser observado na riqueza dos detalhes artesanais de uma fictícia cidade chamada Brogodó, em uma narrativa mítica de uma época não especificada na história. Mesmo assim, toda a equipe se aprofundou em referências estéticas do final do Século XIX e do início do Século XX.
“Quando li a sinopse, quase caí para trás. O projeto é muito ousado ao misturar realeza europeia e sertão. Deu certo por ser uma fábula”, acredita Ana Maria Magalhães, produtora de arte da trama, que chegou a alugar a mesma carruagem usada no filme Maria Antonieta, de Sofia Coppola, para as primeiras tomadas da trama, no Vale do Loire, na França. “Já a Brogodó que construímos na cidade cenográfica é a cara do sertão, um mini Brasil com todas as suas enrolações”, avalia o cenógrafo João Irênio.
Dos brocados e rococós para a contemporaneidade, Insensato Coração, trama das oito da Globo, tem dado um baile – literalmente – em suas tomadas na fictícia boate Barão da Gamboa. O espaço de 10 mil metros quadrados, que também abriga o shopping do Grupo Drummond, “resolve” diversas cenas da trama.
A boate conta com uma fachada neoclássica do Século XIX, característica da Zona Portuária do Centro do Rio. Mas é em seu interior onde grande parte das cenas principais da história se desenrolam, em grandes festas e eventos, com pista de dança para 200 pessoas, palco com plateia para 250 lugares, bares e sala de jogos. Já a torre do shopping é inserida em computação gráfica, que reproduz 40 andares.
“É um processo bastante utilizado no cinema americano. A maquete possui uma base de 18 metros quadrados e dois metros de altura”, detalha Mário Monteiro, diretor de arte da produção. O mesmo efeito foi realizado com o fictício edifício Titã, em Tempos Modernos, também da Globo.
Outro prédio de destaque em novelas que estão no ar é o edifício abandonado de Regina, personagem da esnobe vilã Beth Goulart, em Vidas em Jogo, da Record. Construído na cidade cenográfica da trama em Barra de Guaratiba, na Zona Oeste do Rio, o prédio foi o ponto de partida de toda a ambientação da história, segundo o diretor de cenografia da trama, Daniel Clabunde. Na produção, o prédio de três andares de janelas e vidros quebrados era reduto de parte dos ganhadores do bolão da loteria, que ficaram milionários na história.
“Comecei a construir prédios que lembrassem o Centro do Rio, a região onde se passa a história, ao redor deste prédio. Mas o cenário que mais vai se destacar nessa nova fase vai ser a mansão da Marizete. Vai ser tudo ‘over’ como ela”, adianta Daniel, sobre a personagem de Betty Lago, que era doméstica antes de virar milionária.
Além da comédia, dos brocados e das badalações, a tecnologia também está mais presente nos cenários com apelos high tech e uma infinidade de atrativos visuais. Em Morde & Assopra, Ícaro, papel de Mateus Solano, sempre aparece em seu cibernético laboratório montado no porão da casa do personagem. A estrutura é toda de cimento e ferro e os objetos antigos se misturam a toda sua parafernália eletrônica.
Para contrastar, a trama volta e meia atrai todos os olhares com impressionantes ossadas pré-históricas de dinossauros. “Elas são feitas de resina e gesso. Cada uma leva três meses para ficar pronta”, explica André Soeiro, produtor de arte. “Independentemente da trama, a cenografia e a produção de arte devem sempre caminhar juntas, principalmente em trabalhos de reconstituição de época. Quanto mais pesquisarmos materiais, tendências, quanto mais estivermos com nossas parabólicas abertas, melhor desenvolveremos nossos trabalhos”, ressalta Daniel Clabunde.
Sem fronteiras
Os maiores trabalhos de cenografia não costumam ser a construção de gigantescas cidades cenográficas, mas a projeção e a idealização verossímil dos costumes, hábitos e pesquisas de outros povos nessas cidades. Ou seja, tramas como Caminho das Índias e Passione, por exemplo, que se passavam em grande parte no exterior, necessitavam de uma pesquisa redobrada para serem exibidas da forma mais real possível.
No caso da história de Glória Perez, que foi gravada em cidades como Jaipur, Jodhpur e Mumbai, na Índia, o diretor de arte Mário Monteiro e a equipe da produtora de arte Ana Maria Magalhães passaram meses por lá pesquisando os mais minuciosos detalhes para reproduzir nas três cidades cenográficas da história. Foram refeitos, nos mínimos detalhes, 42 lojas, o templo em homenagem ao deus hindu Shiva e os interiores das casas, além das reproduções do Rio Ganges e uma de suas escadarias. Para representar o trânsito indiano, a equipe de arte chegou a trazer oito tuk-tuks e 12 riquixás da Índia. “O trânsito deles é caótico, com elefantes, carros, camelos, ônibus, todos juntos”, conta a produtora de arte.
Na Itália de Passionenão foi diferente. Os cenógrafos May Martins e Fernando Schmidt e mais 13 profissionais de cenografia pesquisaram durante seis meses e fizeram três viagens à Itália para construir uma área tipicamente rústica como a Toscana no Projac. Para outro núcleo, os cenógrafos reconstruíram a Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo) em uma outra cidade cenográfica de 2.411 metros quadrados com 400 caixotes de legumes e verduras e 80 sacos de milho cenográficos. “Na cidade cenográfica da Toscana recriamos uma espécie de microcosmos do local. Não representamos apenas uma fatia da região replicada. Para isso, tiramos mais de seis mil fotos da região”, destaca May Martins.
Instantâneas
# Uma dos maiores preocupações dos cenógrafos e produtores de arte em tramas de época são as cores e pigmentos utilizados. Afinal, nem todos os matizes existiam em diversos momentos da história. Em Sansão e Dalila, da Record, por exemplo, a equipe não podia usar roxo, que não havia no período antes de Cristo.
# Para criar a casa do estilista Victor Valentim, em Ti-Ti-Ti, da Globo, os cenógrafos Zé Cláudio Ferreira e Marcelo Carneiro pesquisaram diversas construções da Espanha até chegar em uma referência arquitetônica de Sevilha. Eles acharam que seria “a cara” do personagem.
# Para recriar a Galeria do Rock do Centro de São Paulo em Tempos Modernos, a produtora de arte Andréa Penafiel passou 40 dias no local pesquisando as lojas para reproduzir toda a ambientação na trama de Bosco Brasil.
# Segundo o cenógrafo Keller Veiga, de Três Irmãs, também da Globo, o paisagismo é um dos recursos de maior importância para que as cidades cenográficas pareçam mais realistas. “As plantas precisam estar exuberantes desde o primeiro dia de gravação”, explica Keller.
TERRA

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